Antropologia
Presidente da Funai e Washington Novaes são entrevistados em Roda Viva
Roda Viva é um respeitado programa de entrevistas da TV Cultura.
Ontem o atual presidente da Funai, coadjuvado pelo jornalista Washington Novaes, foi entrevistado por alguns importantes jornalistas brasileiros, como Ricardo Noblat, Cláudio Ângelo e Demétrio Weber. Washington Novaes, respeitado jornalista goiano defensor do meio ambiente, dono de uma coluna semanal no jornal
O Estado de São Paulo, com evidente ansiedade, mais do que fazer perguntas, adiantou informações, corrigiu dados apresentados pelo entrevistado e fez comentários tentando ajudar o entrevistado a ir além de frases feitas e repetidas, de argumentos platitudinários e de respostas evasivas, e trazer alguma informação, algum comentário digno de nota. Evidentemente fazia o papel de protetor.
Washington Novaes é conselheiro do ISA, está contente com a sua presença dominante na Funai, e anda um tanto nervoso com o fato de Mangabeira Unger estar fazendo propostas sobre a Amazônia que vão além do discurso dominante atual de Ongs X fazendeiros. Tentou levantar uma crítica ao ministro, mas parou pelo meio do caminho. Defendeu a passagem da saúde da Funai para a Funasa, algo que as Ongs também concordam, e minimizou o estrago desse ato ao apresentar dados de que a mortalidade infantil tem melhorado muito em aldeias indígenas (sic). Ignora o protesto que os índios de diversas regiões vêm fazendo contra o mal-estar que a política de saúde lhes provoca.
As perguntas dos demais jornalistas variaram desde Raposa Serra do Sol e o problema da presença de arrozeiros, passando pela carência de terras no Mato Grosso do Sul, até o incidente do ataque ritual dos Kayapó em Altamira.
Em nenhum caso uma resposta clara foi dada. O momento mais embaraçoso para o entrevistado foi quando Noblat perguntou quem é índio no Brasil. O entrevistado tentou responder com o comentário que o antropólogo do Museu Nacional, Eduardo de Castro, vem dando em entrevistas. Que ninguém pode se arvorar a definir quem é índio; que índio é quem se diz índio e pronto; é um ato de vontade e auto-determinação; que não se pode dizer que alguém é descendente de índio, e sim, que alguém é índio, assim como não se diz que alguém é descendente de japonês, e sim que é japonês. Esse tipo de sofisma antropológico pega com jovens estudantes, mas não pega no meio de jornalistas espertos. Bastou os jornalistas declararem que têm avós e bisavós indígenas para a coisa virar brincadeira. Ao final, Noblat perguntou se ele, por ser "descendente de índio", poderia ser considerado índio. Recebeu a resposta que sim, e aí a brincadeira virou gozação. Então quero uma terra para mim, foi a tirada final.
Mesmo dizendo, à la Castro, que índio é quem se diz índio, ao ser apertado, o entrevistado termina asseverando que tem que provar que é descendente de alguma sociedade pré-colonial e que vive em alguma cultura coesa diferente da cultura brasileira básica. Isto é, cai na definição clássica do que é índio, tal como está no Estatuto do Índio. Não se pode sofismar indefinidamente.
A entrevista teve uma certa concentração de perguntas sobre como anda a saúde indígena. Prato cheio, já que a Funai não cuida mais da saúde indígena. O entrevistado insistiu que a solução era fortalecer os Distritos de Saúde Especiais Indígenas. Isto é, as carências de atendimento que os índios sofrem podem ser resolvidas por uma questão administrativa. Ora, o grande problema da saúde no Brasil como para os índios é a falta de uma boa relação médico-paciente, que, no caso dos povos indígenas, significa uma renovação do indigenismo de saúde. É surpreendente que isto não seja óbvio para o atual presidente da Funai, quando todos os funcionários do órgão sabem disso. Mais ainda aqueles que vivem diretamente nas aldeias com os povos indígenas. Falta de indigenismo não é questão para ele.
Quando perguntado sobre a recente descoberta (para os brasileiros e para o mundo) de um povo indígena ainda sem contato, fotografado de um avião, o comentário foi de que a terra já estava demarcada, esquecendo que lá vive há mais de 20 anos um baita de um indigenista da Funai praticamente só defendendo um território do tamanho de Sergipe graças ao seu espírito de indigenismo.
O entrevistado acha que a política indigenista atual está melhorando por causa da instalação do Conselho Nacional de Política Indigenista, com a presença de 12 ministérios, 24 representantes indígenas e duas Ongs. Que desse modo a Funai vai articular e coordenar as ações de saúde e de educação. Até o presidente Lula vai estar presente na próxima reunião.
Na platéia estavam alguns índios Guarani de São Paulo e, um pouco afastado, o coordenador do ISA, Beto Ricardo. Este último mirava com severidade aquele que serve o ISA na atuação indigenista da Funai.
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