
Na primeira matéria, os jornalistas exploram o lado moral do problema, sem abordar as questões socioculturais. A matéria tem um tom de denúncia e busca desmoralizar a candidata Dilma. Não existe nenhum compromisso ético em explorar os vários fatores que estão por trás de um fenômeno tão complexo como o aborto. Bem diferente foi a atitude da mesma revista, em um contexto diferente do eleitoral. Na matéria publicada em 1997, os jornalistas exploram as várias questões relacionadas ao aborto a partir do depoimento de várias pessoas que enfrentaram esse problema em suas próprias vidas. É lamentável que uma questão séria como esta esteja sendo tratada de forma oportunista e sem nenhum compromisso ético. Acho que as mulheres brasileiras precisam contar suas histórias. Precisamos ouvir mais as mulheres, ouvir seus depoimentos, entender a complexidade de cada caso e ao mesmo tempo buscar entender como essas histórias estão entrelaçadas. Este é o momento mais oportuno para discutirmos este problema com seriedade, em um ambiente democrático, onde todos os setores da sociedade possam expressar seu posicionamento, debater e discutir idéias. Não podemos tratar o assunto do ponto de vista moralista (seja ele religioso ou não). E a mídia não tem o direito de tentar "lucrar" com o drama de milhões de brasileiras. O bom jornalismo é aquele que explora os diferentes lados da história. É realmente uma pena que sejamos obrigados a conviver com o autoritarismo de certos veículos de comunicação. Isso não condiz com o ambiente democrático. Enquanto o Brasil não resolver o problema dos meios de comunicação nunca vamos conseguir construir uma sociedade verdadeiramente democrática. O poder de comunicar e gerar debates, reflexões e opiniões não pode ficar concentrado na mão de poucos coletivos. É preciso discutir o controle social da mídia, um preceito constitucional de extrema importância para o Brasil. Mas precisamos abordar essa questão de maneira séria. Um bom caminho seria buscar diferenciar o "controle social" do autoritarismo exercido durante os governos militares. Na época a decisão de censura estava nas mãos de um pequeno grupo de pessoas e era exercida de forma autoritária. Não havia discussão com a sociedade. Hoje, no entanto, já não vivemos mais neste contexto. A democracia permite discutirmos critérios éticos, culturais, sociais que devem ser levados em conta por aqueles que controlam os meios de comunicação. O bom jornalismo precisa ser valorizado. É preciso buscar retomar os fundamentos éticos que foram abandonados pelo ritmo frenético dos editorais, preocupados unicamente com o lucro. É preciso buscar uma harmonia entre os vários interesses em jogo, principalmente, sobre o exercício do direito de imagem e do acesso aos meios de comunicação.