Antropologia
Índios do Juruena vêm a Brasília falar com o presidente da Funai
Alguns dias atrás representantes de diversos povos indígenas da região do Juruena, no Mato Grosso, entre eles os Enawene-nawe, os Cintas-Largas, os Irantxe, os Myky e os Kayabi, fecharam a estrada que liga Juina a Brasnorte, duas cidades de uns 20 mil a 30 mil habitantes que foram criadas não mais que 40 anos atrás. Hoje são centros de uma região em expansão agrícola, como outras cidades no oeste matogrossense.
Protestavam contra diversas coisas que a Funai e o governo brasileiro lhes devem. Alegavam não terem sido ouvidos no modo tradicional, daí terem apelado para o fechamento da estrada. Abriram-na depois pela intervenção do governo do Mato Grosso, que não gosta que suas estradas de transporte de commodities sejam interrompidas.
Os Enawene-nawe querem a demarcação de uma área de terras que é banhada pelo rio Preto, que alegam ser tradicional de seu modo de vida, e que ficara de fora na demarcação de sua terra indígena. Note-se que a demarcação da terra indígena dos Enawene-nawe foi concluída no fim da década de 1980, a partir de estudos feitos pelo pessoal da OPAN (Operação Anchieta), ligada à Igreja Católica, que é quem fez o contato inicial com esse povo indígena e quem os tutelava até recentemente, quando os próprios índios resolveram expulsá-los e pedir a intervenção da Funai. O missionário Vicente Cañas, morto na região supostamente a mando de fazendeiros locais, é que foi o principal responsável pelo contato e pelos estudos de demarcação. Porque deixaram essa parte da terra indígena de fora é que é um mistério. Agora se cobra da Funai a sua recuperação.
Os Kayabi querem a demarcação de uma terra indígena chamada Batelão, onde algumas famílias viviam há muitos anos atrás, cujos estudos já foram feitos pela Funai, mas o Ministério da Justiça vacila em emitir portaria de demarcação pelo fato de já existirem fazendas na área.
Os Irantxe querem a ampliação de suas terras, já demarcadas, também com estudos feitos pela OPAN. Os Irantxe são um desses povos, junto com os Pareci, os Rikbatsa e outros, que foram missionizados pela Missão Anchieta, dos padres jesuítas, a qual foi extinta pela própria Ordem, por uma espécie de decurso de prazo histórico. Estavam fora de moda e padres jesuítas como Thomas de Aquino e Vicente Cañas passaram a rejeitar os métodos antigos de catequese. Aliás, é de lembrar que os principais criadores do CIMI vieram da Missão Anchieta.
Os Myky, idem, querem a ampliação de suas terras já demarcadas. Note que esse povo indígena foi o último a ser contatado na região, também pelos padres da Operação Anchieta. Ficaram com eles até recentemente, na idéia de que a Funai não sabia cuidar de índios. Mas se surpreenderam quando os líderes, que a própria OPAN havia formado, começaram a vender madeira para os madeireiros locais e a OPAN desistiu de prestar-lhes assistência. Aí a responsabilidade ficou com a Funai. No ano passado estive com esses índios, sobrevoei a área de expansão pretendida e constatei o quanto está tomada de fazendas. Mas dá para demarcá-la, ao menos uma parte dela. Iniciei o processo de demarcação pela busca de antropólogo para fazer os estudos de justificativa. Não sei em que pé está esse processo agora.
Os Cintas-Largas querem que lhes paguem um pouco mais do foro que uma empresa de eletricidade paga por uma pequena usina hidrelétrica, tão pequena que já está em vias de abandono, que está em suas terras.
Mas, ao final, os índios protestam pelo medo de que o rio Juruena seja atravessado por uma série de 11 PCHs (pequena central hidrelétrica) que está sendo planejado e em estudos de viabilidade. Temem com razão e precisam de explicações para aceitar ou rejeitar essa proposta, que a todos parece absurda pelo exagero. Por enquanto, rejeitam porque temem pelo seu grande e lindo rio Juruena.
Eis um dos grandes gargalos e dilemas da política indigenista brasileira e especialmente da Funai. Por mais que tenha consciência e boa vontade, não tem capacidade física e pessoal para dar conta de todos os problemas. Este é mais um, de explicações e de ações. Explicar não custa tanto, se se souber o quê explicar, como e com certeza de que se está dizendo a verdade. Ações são mais difíceis. Demarcar essas terras será um problema muito sério, com muita concentração de energia e com o aceite dos índios para o tempo que vai ser necessário para tal.
Bem, aí está a notícia. Não sei como esses índios sairão de Brasília, se com promessas vãs ou com o conhecimento realístico das coisas.
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Indígenas de MT se reúnem em Brasília
Uma comissão de 42 líderes indígenas de sete etnias de Mato Grosso se reúne amanhã com o presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Márcio Meira, em Brasília. A comissão representa os índios das etnias kayabi; miky e manoki; rikbatsa; irantxa; kawahiva; cinta-larga e enawene-nawe que bloquearam na semana passada a ponte do rio Juruena, entre Juína e Brasnorte (Noroeste de Cuiabá), para protestar contra o Governo Federal.
O encontro em Brasília, que motivou a suspensão do bloqueio da ponte, foi marcado após a intervenção de uma comissão composta por representantes do Governo do Estado e da Funai de Cuiabá. Eles estiveram no local do protesto, no sábado, para negociar com líderes indígenas. Já havia uma determinação judicial para o desbloqueio da rodovia.
O bloqueio começou na madrugada de quinta-feira (31) e terminou no sábado (02). Pelo menos seis cidades ficaram praticamente isoladas neste período. O acesso aos municípios de Juína, Castanheira, Juruena, Colniza, Cotriguaçu e Rondolândia só estava sendo possível por estradas secundárias. O acesso principal, pela MT 170 estava bloqueado. Os índios querem a demarcação de territórios, aplicação de recursos em áreas indígenas e estudos de impacto ambiental referente a rodovias que passam por reservas.
Os índios também pedem que seja proibida a implantação de 11 pequenas hidrelétricas no Alto Juruena, chamadas de PCH. Para o secretário-chefe da Casa Civil, João Malheiros, a comissão cumpriu sua função e conseguiu solucionar de forma pacífica e respeitosa. Ele destacou que as reivindicações dos povos indígenas são antigas.
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