Índios do Acre reclamam do trabalho das Ongs
Antropologia

Índios do Acre reclamam do trabalho das Ongs


O relacionamento entre Ongs indigenistas e os próprios povos indígenas está chegando a tal ponto de desconforto que os índios começaram a denunciá-lo.

Vejam essa matéria retirada de um jornal de Cruzeiro do Sul, estado do Acre, e repercutida pela Coiab, a principal instituição indígena do Amazonas.

Parece aos índios que as Ongs foram criadas para ajudá-los a assumir seu potencial político, econômico e social na sociedade brasileira. Mas, ao longo de mais de vinte anos de atuação, a maioria das Ongs só tem deixado os índios mais dependentes, seja delas próprias, seja da FUNAI. Às vezes essa dependência é financeira, pois as Ongs neoliberais saem à frente e conseguem recursos para as organizações indígenas. Às vezes a dependência é ideológica, quando as Ongs neoliberais ditam o modo das organizações indígenas pensarem e atuaram.

Autonomia econômica, autodeterminação política estão longe de serem alcançados pelos povos indígenas e suas organizações.

O problema é sério, haja visto a repercussão dessa matéria entre as organizações propriamente indígenas.

Porém não é totalmente culpa das Ongs. Elas não são capazes de atender o que pretendem os índios porque lhes falta aquilo que também falta ao órgão indigenista brasileiro. Uma visão de futuro, de relacionamento paritário, equilibrado e digno entre os povos indígenas e a sociedade brasileira. Elas, as Ongs, se distinguem da FUNAI e do Estado brasileiro porque se pretendem mais importantes, mais sábias e mais corretas. Não são uma coisa nem outra.

Mais humildade nessa relação por parte de todos: das Ongs, das instituições indígenas e do Estado, dos antropólogos, dos indigenistas e dos índios.

O mundo está em mudança e pode mudar de um modo muito ruim para os povos indígenas. A cobrança está vindo aí, primeiro pelos fazendeiros e políticos locais que estão a exigir participação nos destinos políticos dos povos indígenas e determinar políticas públicas; depois pela exigência do Estado. Aí ficará muito difícil para os índios.

Uma nova visão do relacionamento interétnico brasileiro é o que precisamos. Um novo indigenismo está na ordem do dia. Um novo papel do Estado brasileiro tem que ser construído.

Por isso é que é necessário convocar uma nova Conferência Nacional dos Povos Indígenas.

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Indígenas denunciam ONGs oportunistas

Em Cruzeiro do Sul, os catuquinas que moram próximos à Estrada BR-364 não conseguem mais acreditar em ninguém. Uns chegam e dizem que o bom é isso, que tal coisa é ruim, outros chegam dizendo o contrário.

São oito instituições que trabalham com eles, mas, mesmo assim, eles vivem em condições precárias. Os grupos se aproximam deles para por interesse no sapo campô. Eles levam o conhecimento e não deixam nada em troca. Esse foi um exemplo dado pelo líder indígena Sabá Manchiner, para mostrar oportunismo de algumas organizações não-governamentais (ONG)

Esse tipo de organização tornou-se um lucrativo meio de vida. São inúmeros projetos destinados aos povos indígenas. Essas entidades recebem recursos do mundo inteiro apenas levantando, mesmo que na teoria, a bandeira ?pró-índio?.

Segundo o líder, não há transparências na gestão desses grupos. Ele disse que os índios não sabem sequer quais os projetos em que estão envolvidos. ?Falta transparência. Não há nenhum tipo de prestação de contas com os indígenas?, declarou.

Os pesquisadores ligados a essas intuições, quando não visam ao lucro diretamente, têm interesses nos conhecimentos dos povos indígenas. A contribuição deles é mínima. Eles são os mais beneficiados com essa relação desequilibrada ? aprendem muito, ensinam pouco.

Parte das aldeias não recebe nenhum benefício, mas, sem muito medo de errar, deve existir algum projeto quem empenhe suas etnias. Os índios sabem dos recursos, mas não têm acesso aos programas desenvolvidos?, detalhou Sabá.

Dois caminhos

Os índios acreanos estão no meio de uma bifurcação: se optarem por permanecer em suas aldeias, conservando suas tradições, como os tão noticiados ?índios isolados?, o risco é virarem seres folclóricos, preservados num museu natural.

?Todo o mundo tem opinião sobre a vida dos índios, menos eles mesmos. Essa é a situação em que se encontram os tão famosos ?povos da floresta??, desabafou o líder.

Caso queiram trilhar pelo segundo caminho, deixando suas terras para viverem na cidade, imersos numa cultura alheia, os problemas serão ainda maiores, como o alcoolismo e a miséria. ?Se um índio busca melhoria de vida para ele e para os outros, logo é taxado como autoritário e contra o sistema?.

?Acredito que é possível permanecer sendo um povo, obtendo outros conhecimentos, sem se apropriar do conhecimento alheio, tendo respeito e equilíbrio entre as culturas. O que não pode acontecer são os indígenas serem obrigados a ficar isolados só como propaganda.

Quando tudo começou

Sabá Manchineri lembrou que, na década de 1980, quando surgiram as primeiras ONGs, o discurso deles era capacitar os índios para terem autonomia e condições de executarem seus próprios projetos. Mas o que acabou acontecendo foi o contrário, os pesquisadores se especializaram na cultura indígena nos conhecimentos tradicionais, ganharam dinheiro e foram embora. ?Os índios não ficaram conhecimento sequer para relatar seus problemas?, salientou.

A saída proposta pela liderança é o incentivo a políticas mais claras e a líderes indígenas que possam gerir seus próprios recursos e lutar pelo diretor dos grupos indígenas. ?Precisamos de preocupações verdadeiras?, finalizou.

Survival International arrecada euros em nome de índios isolados

Um exemplo da ação da ONGs ligadas às causas indígenas é esta matéria de Altino Machado.

?A pretexto de proteger os índios isolados da fronteira Brasil-Peru, vítimas dos madeireiros peruanos que invadem e destroem suas terras, a Survival International lançou uma nova campanha mundial para obter a doação de euros para a organização e o envio de cartas ao presidente peruano Alan Garcia em apoio aos indígenas?.

?Survival, cuja sede funciona em Londres, não explica como o dinheiro da arrecadação será transformado em ações de proteção de etnias que vivem isoladas e se defendem das ameaças basicamente com arco e flecha. A organização sugere doações que variam de 6 a 100 euros. Mas o contribuinte tem a opção de fazer doação mensal, trimestral e anual de valores maiores, optando por tornar-se sócio ou não?.



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