Antropologia
Indigenista Waldira Barros fala do seu constrangimento de ser barrada na Funai
Esta semana que se passou uma comitiva de Pernambuco veio a Funai para conversar com a cúpula do órgão sobre o malfazejo decreto de reestruturação. A comissão esperava convencer a cúpula do seu erro e ajudá-la na revogação, se não revisão do mesmo.
Qual o quê!
Pernambuco e Paraíba foram os primeiros dois estados que se rebelaram contra o tal decreto. Mais de 400 índios desses dois estados estiveram em Brasília e tomaram a Funai por uma semana, na primeira quinzena de janeiro. Porém, sentindo que não conseguiriam resolver a questão de imediato e com dificuldades para permanecer em Brasília, após algumas conversas com a cúpula da Funai, terminaram voltando para suas terras, sem nenhuma promessa de revogação do decreto ou de sua revisão.
Bem, os funcionários de Recife continuaram na luta, com o apoio dos índios retornados, que, segundo o que dizem, não desistiram da luta de revogar o decreto.
Na chegada das três funcionárias ao prédio da Funai, na terça-feira passada, elas foram barradas duas vezes pela Guarda Nacional, que continua de plantão na porta da Funai não deixando ninguém entrar que não tenha um assunto direto a tratar com algum funcionário. Mesmo que essa pessoa seja funcionário do órgão, ou, ainda mais inacreditável, um índio.
Índio barrado na entrada da Funai??? Eis a situação do órgão indigenista sob a atual direção.
Waldira Barros era uma dessas três pessoas que vieram na comissão de Recife. Ela e Estela Parnes, ex-administradora da extinta AER Recife, foram barradas na portaria. Mostraram suas carteiras funcionais. Nada. Um funcionário novato, ligado à cúpula, disse: "Manda elas lerem a portaria do presidente da Funai!!" Depois de conseguir entrar, pela intervenção de um funcionário vetereno que as conhecia, as duas tiveram uma estranha conversa com uma recém-contratada funcionária que foi nomeada para o setor financeiro. Lá as duas foram destratadas e ganharam a petulante sugestão de que saíssem da Funai se não estivessem gostando do decreto.
A frase proferida pela tal funcionária lembra o tempo da ditadura militar que usava um dos slogans mais cretinos da época. Qual seja:
"Brasil: Ame-o ou deixe-o!"
A nova frase parece ser: "Decreto de reestruturação: Aceite-o ou saia da Funai!"
Isto é inaceitável moralmente e revoltante sobre qualquer ponto de vista.
Eis a mensagem enviada ao Blog via email:
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Oi Mércio,
Gostaria que este depoimento fosse lido por todos os servidores. Se ajudar de alguma coisa, para que todos levatem a cabeça e se orgulhem pelo que foi efetuado até hoje em nome dos índios.
A situação foi bastante humilhante. Convidadas pelo presidente para uma reunião, tínhamos realmente muita coisa a ser conversado e apresentado. Porém, não passamos apenas por esse.
No primeiro dia, estivemos em reunião com as coordenadoras Francisca Picanço e a Socorro Brasil. Todos sabem que não levo desaforos para casa, os problemas poderiam tirar a concentração do foco. Fomos totalmente desarmadas, pensando na situação dos índios, servidores, fornecedores e parceiros.
Após alguns questionamentos, fui surpreendida com uma resposta atrevida da senhora Chica Picanço - ?caso não concordasse com a situação, que saísse da FUNAI?. Tentei me controlar e manter a linha, foi em vão. Respondi: ?Você me tenha respeito, não sou nenhuma novata na FUNAI, tenho trabalho reconhecido nacionalmente, e mais de vinte anos de casa?. Percebi que era um amortecimento para a conversa principal.
Se nós servidores somos tratados desse modo, coitados dos índios. Quer falta de respeito maior do que esse Decreto? Quiseram separar o trigo do joio, fala do Presidente, porém colocaram todos no liquidificador e jogaram em um buraco de lama, qual um bandido. Esqueceram todos os trabalhos realizados, será que valeu a pena tanto esforço e trabalho fora do horário? A punição foi na mesma proporção. E olha que não estamos brigando por DAS e sim por uma explicação e um entendimento.
Fiquei triste, quase não se vê na instituição os nossos colegas de trabalho. Senti-me uma estranha na minha própria casa. Esse fato ocorrido na portaria, na frente de colegas, o constrangimento foi maior somando aos demais expectadores - seguranças e policial da Força Nacional. Naquela hora tive dúvidas se valia a pena tudo aquilo, o estrago já estava feito.
Não bastando, no outro dia, ocorreu de novo o fato, desta vez, sem justificativa, estávamos em horário de expediente. Ao sair de Recife, esperava no mínimo respeito enquanto servidora. Ao mostrar a carteira funcional o descaso foi tanto que senti vergonha de entrar na instituição. Tive vontade de voltar para minha terra, sem falar com ninguém. Porém, em respeito aos colegas que estavam comigo, continuei firme e indo mais longe, pensei nos índios, nos servidores, fornecedores e parceiros que aguardavam um resultado.
Obriguei-me a seguir em frente. E acho que fizemos e adotamos as providências corretas. Entramos com uma representação. Apesar de achar que não vai dar em nada. As coisas foram longe demais, perdi a alegria no trabalho, a paixão pelo êxito, nada disso foi levado em consideração. Senti-me uma bandida, vagabunda, cadela sarnenta. A que ponto tivemos que descer para subir um elevador para não perder a oportunidade de brigar por um ideal e idéias. Chorei muito, aquele choro silencioso, sei que cada uma de nós fez isso, para não desanimar a outra.
Agora, ao escrever este depoimento, estou chorando de verdade e sem medo de me expor. Quem tem valor hoje é quem não entende de índio, nós somos meros gagás. Acredito que nossas considerações e indagações de nada valeram. Eles estão tão certos que nossa opinião nada vale. Isso dói e como dói. É simplesmente dilacerante. Os índios, como o Presidente afirma, a nível nacional, já estão conformados e orientados. Queira a Deus que isso não resulte em algo mais grave. Foram tão deprimentes as situações, que preferia não terem sido divulgadas, até mesmo para evitar reações dos indígenas que nos conhecem, porém inevitável, na frente de tanta gente, não passaria despercebida.
Obrigada CHICO e JANICE que tentaram a todo custo contornar e amenizar a situação. Sei que o constrangimento também atingiu vocês, como a outros servidores que tomaram conhecimento. Foi pior do que uma tapa no rosto. Levantei-me e continuarei na luta sim, agora mais do que nunca. Por mim e em nome e respeito aos demais colegas e aos índios. Obrigada, amigos, pelo apoio, confesso que estava precisando disso.
E que isso sirva de estímulo para que outros não baixem a cabeça. Vamos nos fazer escutar. Pode até não dar resultado, porém tenho certeza que incomodaremos. Fui de braços e mentes abertos e, literalmente, voltei com eles cruzados. Desculpem os erros, ainda estou vazia de sentimentos e de conhecimentos, imaginem de uma boa escrita e concordância. Porém o desabafo serviu para que minha adrenalina voltasse e com força total.
Estou nesta servidores! Levantem a cabeça, sacudam a poeira e deem à volta por cima. Esse é o lema. Não vamos baixar a cabeça JAMAIS.
Waldira Maria de Barros
Téc. Com. Social
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