Antropologia
Gregory Bateson: uma figura interdisciplinar
"O mais interessante dos jovens forasteiros ingleses nos anos entre as duas grandes guerras, porém, foi Gregory Bateson (1904-1980). Ele vinha de uma família acadêmica, de classe média alta. Seu pai, o famoso biólogo William James, deu esse nome ao filho em homenagem a Gregor Mendel, criador da genética. Bateson estudava biologia quando Haddon, em conversa com ele num trem com destino a Cambridge, o converteu para a antropologia, e ele logo partiu para pesquisas de campo na Nova Guiné. Depois de uma tentativa fracassada de trabalho de campo entre os bainings, Bateson estudou os iatmuls, um povo das terras baixas cujo ritual
naven formou a espinha dorsal da primeira (e única) monografia etnográfica de Bateson,
Naven (1936).
Na Nova Guiné, e ao que parece numa viagem de canoa no Rio Sepik, Bateson encontrou Reo Fortune e sua esposa, Margaret Mead, que realizava trabalho de campo na mesma região. A descrição desse encontro se tornou um clássico da antropologia. O encontro foi intenso sob todos os aspectos. Os três falaram sobre antropologia e a vida em geral, discutiram sobre as diferenças entre os povos que estavam estudando e analisaram corajosamente suas próprias relações pessoais. Quando a situação se acalmou, Fortune e Mead se divorciaram, Bateson se casou com Mead e em 1939 ambos de mudaram para os Estados Unidos.
O encontro de Mead com Bateson ilustra a relação entre a antropologia inglesa e americana nesses anos. A admiração de Bateson pelo intelectualismo elegante de Radcliffe-Brown foi posta à prova pela intuição de Benedict com relação à psicologia e às emoções. Qual era o papel específico do antropólogo: descobrir princípios sociológicos gerais ou descrever as sutilezas da comunicação humana? Um excluía o outro? Ou existia uma linguagem comum que podia abranger a ambos? A monografia de Bateson é uma expressão desses dilemas. No ritual
naven, homens iatmul se vestem de mulher e representam o desejo homossexual por seus sobrinhos jovens. Bateson analisou esse ritual a partir de três perspectivas analíticas distintas. A primeira foi 'sociológica e estrutural', inspirada por Radcliffe-Brown. À segunda ele chamou de
eidos (um estilo cognitivo e intelectual da cultura) e à terceira de
ethos (de Benedict). Ele achou muito difícil conciliar, para não dizer sintetizar, esses três enfoques, e acabou desistindo da tarefa. Como foi publicado originalmente em 1936,
Naven se constitui assim num enigma não solucionado. Só em 1958 apareceu uma segunda edição do livro, com um longo apêndice em que Bateson procurou amarrar as várias pontas soltas.
A monografia de Bateson foi uma obra ambígua, com pouca influência sobre a antropologia da época. Seus contemporâneos ingleses não sabiam o que fazer com ela (Kuper 1996), mas seu prestígio foi aumentando à medida que se tornava claro que ela antecipava várias mudanças que ocorreram na disciplina a partir da década de 1950. Assim, Bateson critica a ideia de 'função' que, do ponto de vista dele, é teleológica. As explicações funcionalistas devem ser sempre examinadas com todo rigor, para verificar se elas de fato especificam todos os encadeamentos pelos quais os 'propósitos' e 'necessidades' do todo são comunicados ao ator individual. Esse exame nos levará a concentrar-nos no processo e na comunicação, e não na função e na estrutura.
Bateson foi um intelectual excepcional que ainda inspira comentários de admiração. Depois da guerra, seu interesse pela comunicação e pelo processo o aproximaria de estudiosos brilhantes em muitos campos: psiquiatras, psicólogos, etólogos, matemáticos, ecólogos, biólogos, etc. Ele logo se tornou uma figura interdisciplinar que fez contribuições importantes para campos como o da psicologia e da teoria das comunicações e foi pioneiro no uso de modelos cibernéticos na explanação antropológica. Mesmo antes da II Guerra Mundial, seu trabalho de campo fotográfico com Mead sobre Bali mostrou sua disposição de explorar os limites da antropologia. Durante a guerra Bateson contribuiu com os estudos de Mead sobre o 'caráter nacional' e trabalhou numa teoria da comunicação que influenciou muitos estudiosos, antropólogos ou não".
ERIKSEN, T. H. e NIELSEN, F. S. História da Antropologia. RJ: Editora Vozes, 2007.
As ideias de Bateson foram publicadas em uma série de ensaios, que foram reunidos em três livros:
"Steps to an Ecology of Mind" (1972)
"Mind and Nature: a necessary unity" (1979)
"A Sacred Unity: further steps to an ecology of mind" (1991)
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