Antropólogos temem fazer laudo sobre morte de garimpeiros
Antropologia

Antropólogos temem fazer laudo sobre morte de garimpeiros


A Folha de São Paulo sai hoje com importante matéria sobre o fato dos antropólogos indicados pela Associação Brasileira de Antropologia se recusarem a fazer o laudo antropológico sobre o conhecimento que os Cintas-Largas que participaram do massacre dos 29 garimpeiros, em abril de 2004, têm ou não têm consciência de que estavam praticando um ato criminoso.

Podemos até imaginar porque se recusam a fazer isto. Mas alguém tem que fazer isto antes que a Antropologia brasileira se desmoralize.

Por outro lado, a própria Funai poderia designar um antropólogo dos seus quadros para fazer esse laudo, junto com os seus procuradores, alguns dos quais têm muita experiência sobre crimes praticados por indígenas.

A matéria é forte e precisa ser meditada. O assunto não vai morrer à toa.

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Sem laudo, investigação sobre índios pára

Antropólogos se recusam a fazer parecer que ateste se cintas-largas sabiam que cometiam crime no caso do massacre de garimpeiros

Em relatório ao Ministério Público, delegada da PF diz que, após dois anos, desiste de obter a avaliação; peça é fundamental ao julgamento

ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO

Dois anos após o indiciamento pela Polícia Federal de 23 índios cintas-largas e um funcionário da Funai pelo massacre de 29 garimpeiros, em Rondônia, ocorrido em 2004, a investigação emperrou por falta de laudo antropológico que ateste se os índios tinham ou não discernimento de que cometiam crime. A Polícia Federal não conseguiu antropólogos que se dispusessem a fazer o trabalho.

O laudo é peça fundamental para que os índios sejam levados a julgamento. Sem ele, o Ministério Público Federal até pode denunciar os acusados, mas os advogados de defesa conseguiriam facilmente trancar o processo judicial.

Há dois meses, a delegada da PF Alessandra Borba enviou um relatório ao Ministério Público Federal em que desiste de continuar na busca pelo laudo antropológico. O relatório descreve o fracasso dos contatos feitos desde maio de 2005, quando a Procuradoria da República devolveu os autos do inquérito à polícia para que fosse providenciado o laudo.

O principal empecilho, segundo a delegada, foi a resistência do antropólogo Antonio Dal Poz Neto, apontado por seus pares como o maior especialista na etnia cinta-larga do país. Ele negou-se a fazer o laudo e a orientar outros antropólogos que se dispuseram a fazê-lo, sob sua coordenação.

Em entrevista à Folha, por telefone, o antropólogo disse que tem uma filha adolescente para cuidar e não pode se afastar de Juiz de Fora (MG), onde é professor na universidade federal. ""A vida moderna tem coisas como paternidade responsável", disse. Ele discorda que seja o único com conhecimento suficiente sobre os cintas-largas para fazer o estudo.

Busca pelo laudo

A PF indiciou os acusados pelas mortes dos garimpeiros em 9 de abril de 2005. Quatro meses depois, o inquérito voltou à PF para que a delegada Alessandra Borba obtivesse os laudos antropológicos. São necessários dois laudos, segundo o Ministério Público Federal.

No relatório, a delegada diz que procurou a Associação Brasileira de Antropologia duas vezes, em 2005, para que indicasse profissionais e que a entidade prometeu fazer a indicação, mas não cumpriu a promessa.

Ainda em 2005, a delegada procurou a antropóloga Carmen Alvarenga Junqueira, da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), que, segundo o relatório, afirmou não ter contato com os cintas-largas desde 1989. A antropóloga recomendou à delegada procurar João Dal Poz Neto, que estudou a etnia por cerca de 20 anos. Na época, ele lecionava na Universidade Federal de Mato Grosso.

Em fevereiro deste ano, o atual presidente da associação, Luiz Roberto Oliveira, indicou os antropólogos Aloir Pacini e Maria da Fátima Machado, da UFMT, e Dal Poz Neto, como aptos a fazer os laudos.

Em reunião com a delegada, em abril, os antropólogos insistiram na presença de Dal Poz na equipe, e disseram que não poderiam, a princípio, assumir o encargo sem sua supervisão.

A delegada desistiu da busca após consultar a 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, responsável pelas questões das comunidades indígenas, e ouvir que também seus antropólogos não poderiam fazer o laudo sem a supervisão de Dal Poz Neto, que, segundo a PF, recusou a incumbência todas as vezes em que foi procurado.

Constrangimento

O procurador da República em Ji-Paraná, Svamer Adriano Cordeiro, responsável pelo inquérito sobre o massacre dos garimpeiros, diz que a perícia dos antropólogos pode determinar o destino da eventual ação penal contra os índios, o que explicaria sua resistência.

Se o laudo concluir que os cintas-largas não têm consciência do crime praticado, eles, dificilmente, irão a júri.

Neste caso, os profissionais enfrentariam as críticas das famílias da vítimas. Se o parecer for no sentido contrário, haveria reação negativa das organizações não-governamentais defensoras dos índios.

""Seja qual for o resultado, o laudo trará descontentamento. Não ignoro que é uma missão de grande responsabilidade, passível de inúmeras críticas", afirma o procurador.

Cordeiro cogita recorrer aos antropólogos da Universidade Estadual de Rondônia para obter os laudos, mas adverte, de antemão, que a tarefa será difícil. Recentemente, um índio cinta-larga foi preso como mandante da tentativa de assassinato de um advogado.

O primeiro laudo antropológico obtido foi no sentido de que ele não tinha discernimento do crime.



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