O Atentado de 11 de Setembro de 2001
Antropologia

O Atentado de 11 de Setembro de 2001


Passaram-se dez anos desde o ataque às torres gêmeas, em Nova York, em 2001. Trata-se, sem dúvida nenhuma, de um evento crítico na vida de ocidentais e não-ocidentais. O "11 de Setembro" foi - depois da primeira Guerra no Iraque - um dos primeiros acontecimentos "globais" transmitidos "ao vivo" para o mundo inteiro e exaustivamente comentado nos anos posteriores. Afinal, quem não lembra o que estava fazendo quando recebeu pela primeira vez a notícia sobre os atentados na terra do Tio Sam? O sentimento geral foi de perplexidade diante de um evento até então impensável. Afinal, apesar da política belicista e intervencionista dos norte-americanos produzir inimigos no mundo inteiro, ninguém imaginava que um ataque em solo americano seria, algum dia, possível. O poder da maior potência militar do mundo parecia, naqueles dias de pós-guerra fria, absoluto e inabalável a qualquer ataque estrangeiro. Foi então que, no início da manha do fatídico dia, o centro financeiro do capitalismo sofreu um abalo inesperado. As imagens das torres gêmeas em chamas marcou, certamente, o imaginário político de toda uma geração.

Os homens que sequestraram e jogaram os aviões comerciais contra as torres gêmeas e o Pentágono demonstraram claramente que nenhum governo do mundo, por mais poderoso que seja, tem condições de conter ou se prevenir inteiramente contra ataques terroristas. Afinal, a ação foi tão inusitada quanto arrojada. Inclusive, esse estilo de guerrilha rompe com qualquer lógica de batalha ao fazer uso de táticas e meios nada convencionais para atacar o inimigo, como trens, homens, aviões, carros e outros objetos produzidos pela modernidade, utilizados como instrumentos ou ferramentas de ataque. Como encontrar o "alvo" quando o inimigo é um mutante que pode assumir qualquer forma e estar em praticamente qualquer lugar? Sem estrutura hierárquica que possa ser identificada e combatida, as células terroristas atuam como pequenos nódulos em uma rede múltipla, rizomática e de extensão variável, presente em todo e em nenhum lugar ao mesmo tempo, desafiando qualquer estratégia militar ou de inteligência policial. Como nômades contemporâneos, grupos de jovens passam dias planejando ataques inesperados e suicidas, misturando-se junto à sociedade do inimigo, convertendo-se em uma espécie de predador parasita que pode atacar a qualquer momento.

Inclusive, é importante observar que a prática terrorista não é nenhuma exclusividade dos árabes, tendo em vista o seu vasto uso no mundo ocidental. As ações de grupos extremistas de direita na Europa não são menos "terroristas" do que os ataques dos "homens-bomba". Sem falar dos inúmeros atentados cometidos por ocidentais no mundo inteiro, inclusive nos Estados Unidos. Isso sem falar de outra forma de terrorismo de Estado tão comum em países ocidentais, com os ataques à população civil palestina cometidos pelo exército de Israel ou as tantas intervenções das forças armadas norte-americanas. Mas, se o terrorismo não é nenhuma exclusividade dos "terroristas", o ataque de 11 de setembro entrou, certamente, para a história dos Estados Unidos.

De fato, desde então a vida dos norte-americanos jamais foi a mesma. As medidas de segurança implantadas pelo governo Bush mudaram completamente o cotidiano desse país, que vive ainda hoje sob um vasto sistema de vigilância estabelecido em nome da "segurança nacional" e que resultou em uma clara limitação dos direitos civis tão valorizados nos Estados Unidos. As medidas de segurança mudaram a vida dos americanos, impondo sérias restrições a sua privacidade. Além das vítimas diretas do atentado de 11 de Setembro, o povo norte-americano passou a sofrer diariamente restrições as suas liberdades civis, muitas vezes sem entender que o ataque às torres gêmeas não era uma ação unilateral, mas uma resposta a um movimento intervencionista colocado em prática pelos seus próprios governantes. Esse contexto de "terror" acabou resultando na polarização das forças políticas nacionais e na emergência de um movimento civil que acabou por eleger Obama como presidente dos Estados Unidos. Com isso, acreditou-se, por alguns meses, em uma mudança de rumos da política externa norte-americana, o que acabou não ocorrendo. A crise econômica e política que os Estados Unidos enfrenta é, de certa forma, um dos tantos efeitos dos ataques de dez anos atrás.

O avanço da rede rizomática de grupos extremistas no mundo inteiro acabou desencadeando um movimento de intensificação do caráter arbóreo das forças policiais norte-americanas, dando início a um sistema de vigilância sem precedentes na história deste país. Mas, conforme esclarecem Deleuze e Guattari, árvores costumam germinar rizomas... Assim como rizomas costumam desencadear hastes que, mais adiante, podem assumir a forma hierárquica de uma árvore. O extremismo político que tem pautado a ação de republicanos e democratas de leste a oeste é um efeito de uma lenta polarização da opinião pública que tem produzido resultados nefastos nos últimos anos. Apesar disso, no entanto, o povo norte-americano continua buscando achar um caminho diante da atual crise econômica.

Por outro lado, a intensificação da política belicista que ocasionou os ataques parece ter contribuído para a ampliação e fortalecimento do alcance da rede de inimigos do Tio Sam, que assumiu nas últimas décadas uma extensão planetária. A invasão do Iraque foi um verdadeiro desastre militar, pois contribuiu para a crise econômica nacional (basta ver os gastos do governo com a guerra) e isso tudo sem qualquer resultado pragmático. O governo norte-americano respondeu à violência com mais violência, dando início a um ciclo de reciprocidade negativa que ainda não mostrou todo o seu potencial destrutivo. Como um "Golias" que tenta, inutilmente, acertar a mosca posicionada em seu nariz sem causar maiores danos a sua triste face, os soldados norte-americanos enfrentam, desde então, uma "missão impossível" no melhor estilo cinematográfico. Afinal, como combater inimigos cuja forma de organização é descentralizada, a-centrada, múltipla, sem chefe ou estrutura hierárquica, enfim, um conjunto interligado de células relativamente autônomas? E como fazer isso sob um contexto interno de extremismo político e crise econômica? Sim, certamente, "é possível", como diria Obama, mas é preciso reconhecer o caráter épico da jornada.

A meu ver, mesmo a captura do velho Bin Laden em uma casa localizada a poucos metros do centro de inteligência dos aliados - ao invés de ser o sinal da eminente derrota da Al Qaeda - é uma prova da genialidade de seus métodos e estratégias militares. Afinal, a captura do autor do atentado quase dez anos após os ataques e a custa de milhões de dólares e algumas centenas de vidas está longe de ser um sucesso. A maneira como tal captura foi interpretada pelos norte-americanos - como uma vitória sobre o terrorismo e um motivo de orgulho nacional - parece equivocada e isso por diversas razões. Primeiro, porque não estamos diante de um exército constituído por um chefe que comanda uma estrutura hierárquica de subordinados, mas por células com relativa independência de qualquer centro de comando. Bin Laden não exercia um poder baseado em uma prerrogativa formal, como aquela exercida pelo chefe das forças armadas norte-americanas. A sua liderança era, como diria Weber, de ordem 'carismática'. As pessoas seguiam suas ordens por motivos de simpatia política e religiosa. E o problema do líder carismático é esse: a sua eliminação o transforma automaticamente em um mártir, desencadeando um novo ciclo de recrutamento de correligionários e combatentes no mundo inteiro, motivados pela vingança de sua morte. Ao matar um líder prestes a se aposentar, os norte-americanos criaram, automaticamente, novas células inimigas no mundo inteiro. Infelizmente, a morte de Bin Laden é apenas uma etapa em um ciclo de reciprocidade negativa que não parece apontar para um fim próximo.

Eventos como o "11 de Setembro", a "invasão do Iraque" e a morte de Bin Laden fazem parte de um ciclo de violência cujo sentido para a história das relações entre ocidente-oriente ainda é uma incógnita. Talvez estejamos assistindo aos sinais que evidenciam o início da decadência do império norte-americano, algo que a atual crise econômica dos Estados Unidos parece evidenciar de forma mais contundente. As próximas eleições serão uma prova de fogo para a sociedade norte-americana. A esperança de mudança projetada sobre a eleição de Obama precisa ser renovada. Em outros momentos da história, o Estados Unidos demonstrou que é capaz de superar crises econômicas e políticas. De qualquer forma, essa mudança interna deve ser orientada no sentido de uma adaptação da política externa frente ao novo contexto de divisão/distribuição do poder político internacional, marcado pela emergência de novas forças políticas no cenário mundial: os chamados "países em desenvolvimento", como o Brasil, a Índia, a África do Sul e a China.

Independentemente do que vier a acontecer nas próximas décadas, não resta dúvida de que o 11 de setembro foi um evento paradigmático que os americanos e seus inimigos precisam superar. Diante do atual contexto, resta apenas lamentar as milhares de vítimas desse ciclo de violência que não parece ter fim, tanto as vidas perdidas no World Trade Center, como também as vidas consumidas pela política belicista do governo norte-americano e seus aliados militares. As grandes potências precisam entender que é impossível lutar pela democracia de forma autoritária, através de intervenções militares anti-democráticas. Da mesma forma,os grupos extremistas (sejam eles de esquerda ou direita) precisam ter mais tolerância com a diferença ideológica, política e religiosa, buscando meios pacifistas para expor seus ideais. Estamos diante de uma situação onde não existem mocinhos de um lado e bandidos de outro, mas apenas gerações e gerações de vitimas de um conflito de ordem ideológica e política de natureza heterogênea e abrangência global.  



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