Antropologia
Indigenista Wagner Tramm relata reunião e tece novas considerações sobre a Funai
Caros amigos,
Sebastião Noleto é Engenheiro Ambiental, mestre em gestão de resíduos sólidos pela UFTO, selecionado pelo Conselho Interinstitucional Gestor do Programa de Compensação Ambiental Xerente para exercer a função de Coordenador de Meio Ambiente do Procambix. Contratado pelo convênio firmado entre a Funai e a Associação Indígena Akwen em 2004. Um jovem, na época, recém saído da academia, que foi contaminado pela mosca do indigenismo, como dizemos ao ver alguém que se apaixona e se dedica à causa indígena. Responsável juntamente com os Chefe dos Postos Indígenas : Funil, Rio Sono, Brupré, Brejo Cumprido e Xerente, com a participação ativa dos Agentes Ambientais indígenas e Técnicos Agrícolas Akwen, pela condução dos projetos de viveiros de mudas silvestres, frutíferas e de múltiplo uso que resultaram no plantio de quase 100.000 (cem mil) árvores nas áreas degradas das Terras Indígenas Xerente e Funil no Estado do Tocantins. Pela redução comprovada pelo Ibama dos índices de queimadas naquele Estado. Pela realização da feira de sementes Akwen publicada no programa Globo Rural, pela atuação das brigadas de controle a incêndios florestais, pelas atividades de Educação Ambiental e outras desenvolvida pelo Procambix, numa proposta de Gestão Compartilhada protagonizada pelos índios Akwen com recursos alocados pela Compensação Ambiental decorrente da implantação e operação da Usina Hidroéletrica Luis Eduardo Magalhães no rio Tocantins.
É um exemplo da necessidade do Estado brasileiro de formar recursos humanos capazes de auxiliar e assesorar os grupos étnicos na árdua convivência com uma sociedade que embora originária destes, mantém estereótipos, preconceitos e dificuldades de entender a alteridade propícia à construção de um Estado Nação pluriétnico, de convívio fraterno. Ou melhor, de um Brasil de Todos! Diferente do mundo dito desenvolvido, da Europa das guerras étnicas e dos conflitos entre povos cujas visões de mundo têm particularidades propicias à manutenção do ser humano no planeta, ou na nave Terra que é um ponto quase que insignificante no plano universal.
Hoje, ao participar em conjunto com representantes das étnias Kaingangue e Guarani do Sul do País, da Apsul, da Consesef, do Sindsep-DF, de uma reunião na sede do Partido dos Trabalhadores-PT, em especial na Secretaria de Movimentos Populares para solicitar a saída do presidente Márcio Meira e a revogação do nefasto Decreto Presidencial 7056/09, tive o prazer de ouvir da representante da Apsul, Rosane kaingangue e das lideranças indigenas presentes que o Chefe de Posto Indígena é o Agente do Estado brasileiro nos rincões do território nacional que sabe quem são os índios, como vivem, que contribui na proteção das Terras Indígenas e goza da confiança daqueles povos no intermédio e na mediação das relações estabelecidas com o restante do povo brasileiro e suas instituições. Portanto, figura chave na consolidação do almejado Estado de Direito Democrático. Lá nos ermos do nosso território, onde poucos vão, senão movidos por interesses incompatívéis com a nossa soberania, está, ou estava presente, até a publicação do citado Decreto, um Agente do Estado: o Chefe de Posto Indígena idealizado pelo Marechal Cãndido Mariano Rondon, estribado em um compromisso republicano que reconhece o povo indígena com um dos formadores do povo brasileiro, figura essencial na construção do Estado Nação brasileiro!
Agora os povos indígenas estão abandonados a própria sorte, a mercê dos interesses dos fazendeiros, dos madeireiros,dos garimpeiros e outros grupos economicamente hegemónicos que os vêem sempre como um empecilho para o progresso e jamais como parceiros do desenvolvimento nacional.
Durante a reunião posicionando-me como servidor do quadro da Fundação Nacional do Índio, manifestei minha indignação pela publicação desse Decreto que considero etnocida, elaborado a revelia do que preceitua a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho-OIT, da qual o Brasil é signatário; isento da participação dos servidores da Funai e de segmentos da sociedade civil organizada conforme deve ser em um Estado Democrático que continuamos sonhando!
Na oportunidade, alertei ao Secretário de Movimentos Populares do Partido dos Trabalhadores, Sr. Renato Simões, que o governo federal e a gestão Márcio Meira, em função do Decreto, tornar-se-iam responsáveis pelos desdobramentos do tal Decreto e da Medida Provisória correlata, principalmente pela ocorrência de inúmeros e sucessiveis conflitos de ordem interétnicas e interinstitucionais de nível local e regional como os que já estamos vendo nos noticiários jornalísticos, apesar do evidente boicote empreendido pela grande imprensa.
Salientei ainda que não somos contra a Reestruturação do órgão indigenista. Pelo contrário, reconhecemos tal necessidade. Entretanto, verificamos que tal proposta representa o desmonte da fundação destinada a atender os povos indígenas. Centraliza em Brasília a máquina administrativa ao invés de fortalecer a base e/ou as atividades fins, acaba com os PIN'S. Não prevê recursos para as modificações administrativas e de infra-estrutura, não dispõe de critérios, nem se qualifica com uma construção coletiva. É um "impensado" ato deliberado de cima para baixo!
Sérgio Ronaldo, representante da Condesef, esclareceu ao secretario a necessidade de estabelecimento de um diálogo com o governo federal. Alertou que os índios não estão sendo aliciados nem tampouco influenciados por servidores, sindicalistas e simpatizantes. O fato é que o decreto não é uma obra coletiva, não conta com a simpatia dos assistidos, assim como com a aquiescência daqueles encarregados de desenvolver a atividade estatal de proteger e assistir os índios brasileiros.
O representante da Condesef frisou também que lamentavelmente o decreto e a medida provisória publicada logo em seguida permitem ao presidente da Funai redistribuir servidores do quadro da Funai e receber servidores de outros órgãos, numa clara manifestação de substituição dos servidores qualificados por servidores que não detém o know how indigenista.
Sérgio Ronaldo colocou para o secretario que a Condesef está afinada com o movimento indígena e com a posição dos servidores. Manifestou repúdio a presença da Força Nacional na sede da Funai, impedindo o acesso de indígenas e de pessoas do povo, citando inclusive que ele próprio havia sido impedido de ingressar naquele órgão público.
Dentre outras coisas, Rosane falou ainda que os índios do Sul foram recebidos pelos ministros das Cidades, da Pesca e da Cultura, mas não conseguem uma audiência com o Ministro da Justiça para tratar da gestão Márcio Meira e da Revogação do Decreto. Rosane atentou também para o fato de que são os índios que definem o resultado das eleições em grande parte dos municípios. Portanto, não é coerente a adoção de uma medida que os prejudica sobremaneira suprimindo direitos e conquistas.
Estavam presentes, além do secretário, Rosane Kaingangue, lideranças indígenas do sul do país, Tereza do Sindesep, Sérgio Ronaldo e Othon da Condesef. Na sequência deveriam se manifestar Tereza, Othon e líderes Kaingangue, Guarani e outros.
O secretário informou na reunião que o representante do Núcleo Setorial Indígena do Partido dos Trabalhadores, Frederico Magalhães, não havia comparecido aquela reunião devido as atividades preparatórias à visita do presidente Lula no estado de Roraima da qual estava encarregado. Estava se deslocando de Brasília para Roraima....
Devo ter esquecido de relatar outros pronunciamentos, mas espero ter passado aos companheiros os fatos que tenho acompanhado na luta pela revogação do Decreto e por uma salutar mudança na gestão da Funai.
Finalmente, presto aqui, para saudar o amigo Sebastião Nokró, uma homenagem aos indigenistas que contribuíram na elaboração, acompanhamento e execução do Procambix: Glênio Alvarez, Wagner Senna, Rogério Eustáquio, Inês Caribé, Niviene Maciel, Edson Beiriz, Ediana Barreto, Regina Célia, Lídio José, Adriano Leite, Antenor Bastos, Renato Sanches, ao pessoal da Administração Regional de Gurupi e todos aqueles que falham-me na memória, mas integraram a equipe interinstitucional, interétnica responsável pela elaboração e condução do do citado Programa.
As ações do referido programa foram executadas pelos próprios índios través de um convênio com a Funai, fato esse que demonstra que não somos simplesmente contrários a atuação do terceiro setor ou do estabelecimento de parcerias. Somos contra aos convênios firmados sem critérios com as grandes organizações, as ONGs, dos amigos, dos parentes, ou aquelas que mais pretendem defender nicho de mercado e priorizar a contratação de consultorias com pouco ou quase nenhum retorno efetivo para os povos indígenas. A Funai, conforme preconizado em seus Estatutos, deve preparar os índios para a autogestão de seus problemas. Para tanto, deve, antes de mais nada, adotar a filosofia do apreender-fazendo valorizando o estabelecimento de parcerias com as organizações indígenas. O que não tem sido o caso dessa famigerada gestão anti indígena....
O autoritarismo e o totalitarismo não pode ser a melhor estratégia. Pois já disseram que tudo que é sólido se desmancha no ar, tal qual a empáfia, a arrogância e a truculência de Márcio Meira na Funai.
Portanto:
"Ousa lutar .
Ousa vencer!"
Titânicamente, o indigenismo não morre.
Abs
Wagner Tramm
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