Antropologia
Homenagem a Claude Lévi-Strauss -- 3
Instituto de Ciências Humanas e Filosofia
Departamento de Antropologia
Disciplina: Antropologia III
Curso: Ciências Sociais
Prof.: Mércio P. Gomes
Aluna: Lorena Francisco de Carvalho
1 -
Por que, ao final de tantas discussões, Lévi-Strauss chega à conclusão que animais e plantas que são referidos em sistemas totêmicos são "bons para pensar" e não, como achava Malinowski, "bons para comer"?R.: Lévi-Strauss diz ser errada a interpretação de Malinowski, pois acredita que para os indígenas, os animais e plantas referidos em sistemas totêmicos encerram em si uma infinitude de características e significados que fazem pensar à medida que caracterizam uma série de fatores que podem ser úteis para a sobrevivência ou como simbolismo. Ao contrário do que se pensava, os ?primitivos? também possuíam uma ânsia pelo conhecimento objetivo e sabiam portanto, reconhecer as menores diferenças entre as espécies de um mesmo gênero. Ultrapassando o contexto alimentício, as faculdades aguçadas dos indígenas permitiam a eles percorrer um universo de significação e fazia notar até mesmo as mudanças mais sutis dos fenômenos naturais, como o vento, a luz e o tempo. A familiaridade com a fauna e a flora era imprescindível, o nativo é completamente integrado com seu meio ambiente, sobretudo porque conhecer aquilo que o cerca é útil e necessário para sua subsistência, não apenas para alimentar-se, mas também para socorrê-los, pelas propriedades medicinais contidas nas plantas. A extrema familiaridade com o meio biológico, a atenção que lhe dedicam, as atitudes e preocupações, é que diferenciam os indígenas dos ?brancos? por seu intenso interesse de conhecer aquilo que o cerca. Por ser um povo cultivador, as plantas são tão importantes quanto os seres humanos, e nisso insere-se também o aspecto do totemismo, onde muitas vezes há a conexão de uma espécie animal ou vegetal, ou de um objeto inanimado, onde existe a crença numa relação de parentesco entre os membros do grupo e o animal, planta ou objeto e por respeito a esses, manifesta-se tipicamente uma interdição de comer o animal, planta o deixar de utilizar o objeto, retificando assim, a importância de conhecer os símbolos que os cerca, a fim de buscar novas alternativas. Como afirma Lévi-Strauss: ?(...) as espécies não são conhecidas porque são úteis, mas primeiramente são consideradas úteis ou interessantes porque são conhecidas. (...) Ela corresponde a exigências intelectuais ao invés de satisfazer as necessidades.? Assim, os indígenas foram ensinados a prestar atenção a tudo o que vêem ?o mundo animal e o mundo vegetal não são utilizados apenas porque existem, mas porque propõem ao homem um método de pensamento.? Ele forma um sistema, onde se dá a relação do homem com a natureza, num nível mais profundo do que um simples mecanismo de identidade.
2.
Discorra sobre as diferenças e semelhanças entre a ciência do concreto e a ciência do abstrato.R.: No livro, O Pensamento Selvagem, Lévi-Strauss mostrou que a maneira de pensar dos primitivos também tem sua lógica própria e que ela não é estranha ao pensamento domesticado ocidental. A distinção maior é entre a lógica construída a partir dos dados sensoriais da experiência, uma ciência do concreto, e a lógica que privilegia categorias abstratas, como sinais matemáticos e classificações biológicas. Logo, do lado "selvagem", há uma atenção maior ao específico. Do lado "domesticado", buscam-se as totalidades, os grandes esquemas explicativos e o segundo modo prevaleceu na civilização ocidental, mas mesmo nela só é empregado por uma minoria de especialistas, cada um em seu campo de atuação, como exemplo, o autor cita o engenheiro, que só pensa como tal no domínio da engenharia, e em outros termos, seu modo de pensar pode ser considerado "selvagem". Portanto, o pensamento "selvagem" não é restrito aos povos primitivos, ainda que entre eles seja dominante. Assim, o que era antes visto como "atraso" ou "vestígio" passou a ser entendido como um dos modos possíveis de o homem organizar sua relação com o mundo. Já o pensamento científico trabalha com teorias e conceitos, que servem de mediadores entre o ser humano e o mundo. Logo, uma das diferenças entre Magia e Ciência, é que uma postula um determinismo global e integral, enquanto a outra opera distinguindo níveis dos quais apenas alguns admitem formas de determinismo tidas como inaplicáveis a outros níveis, contudo as duas ciências necessitam de organização e em lugar de opor magia e ciência, é preferível colocá-las em paralelo, como dois modos de conhecimento desiguais quanto aos resultados teóricos e práticos. Ambas supõem operações mentais que diferem menos na natureza que na função dos tipos de fenômeno aos quais são aplicadas. Todo e qualquer conhecimento deve ser válido mesmo sem base na razão, pois pode servir por muito tempo, como uma operação teórica. A ciência do concreto deve manter sua validade, pois ela sempre foi o substrato de nossa civilização e tanto o concreto quanto o abstrato pode produzir transformações e trabalham através de analogias e aproximações. ?O pensamento mítico elabora estruturas organizando os fatos, ao passo que a ciência, a partir de sua própria instauração, cria seus meios e seus resultados sob a forma de fatos, graças às estruturas que fabrica sem cessar que são suas hipóteses e teorias?.
3.
Discorra sobre o debate entre Lévi-Strauss e Jean-Paul Sartre a respeito das lógicas analítica e dialética e os sentidos de história e estrutura.R.: Lévi-Strauss contesta duramente a Crítica da Razão Dialética, do filósofo Jean-Paul Sartre, contesta o privilégio concedido por Sartre à história, em detrimento das outras ciências sociais. E nega, sobretudo a idéia de que o desenvolvimento da consciência histórica seria um critério válido para distinguir os "primitivos" dos "civilizados". A própria noção de "fato histórico", para o antropólogo, é falsa: a história só é percebida "em situação", enquanto processo vivido e o fato histórico, portanto, é uma abstração criada pelo historiador e nunca independente do seu ponto de vista. Por isso, a história não pode pretender alcançar uma verdade objetiva como queriam os positivistas e os marxistas. Segundo Lévi-Strauss, a história nada mais é senão uma relação de eventos, condenada à ideografia, então ele ataca a maneira como Sartre a arvora em perspectiva unificadora, totalizadora, pois segundo ele, no sistema de Sartre, a história desempenha o papel de um mito. Segundo Lévi-Strauss, na lógica de Sartre, razão analítica e razão dialética chegam a um mesmo resultado, contudo, segundo Sartre, a razão dialética existe independentemente da razão analítica, pois Sartre chama razão analítica à razão preguiçosa e a razão dialética, ?os esforços que a razão analítica deve fazer para se reformar, se pretende da conta da sociedade, da linguagem e do pensamento?. Segundo Sartre: A razão dialética não pode dar conta de si mesma, nem a razão analítica, pois ?a Razão dialética não é razão constituinte, nem razão constituída, mas sim a Razão constituindo-se no mundo e por ele dissolvendo nela todas as Razões constituídas para constituir novas Razões que, por sua vez, ela supera e dissolve. Portanto, é um tipo de racionalidade e, ao mesmo tempo, a superação de todos os tipos racionais?. Logo, a defesa sartriana da superioridade da razão dialética sobre a razão analítica deriva da necessidade de "acompanhar o movimento graças ao qual as ciências sociais acabaram por atingir sua autonomia metodológica". Pela visão de Lévi-Strauss, a razão dialética não é outra coisa senão a razão analítica e aquilo sobre o que se fundaria a originalidade absoluta de uma ordem humana, mas alguma coisa a mais na razão analítica: sua condição requerida para que ouse empreender a resolução do humano e do não-humano.
4.
Quais as grandes ambições do movimento estruturalista dentro da comunidade científica.R.: ?O estruturalismo constituiu-se em reação contra o atomismo e em torno da psicologia da forma?. Com o estruturalismo passa-se a entender a totalidade dos fenômenos sociais como linguagem, visto que toda estrutura supõe uma construção. A antropologia estrutural postulava uma descontinuidade entre natureza e cultura, assim, o programa estruturalista aspirava descobrir as bases e as leis do grupo estudado. Ao colocar a antropologia no campo da cultura, segundo Lévi-Strauss, a antropologia estruturalista poderia desenvolver-se sem fronteiras, estendendo suas considerações ao conjunto do gênero humano fazendo entender dessa maneira a tipologia e a classificação tipológica, o que por muito tempo escapou à antropologia.
Era objetivo da antropologia estrutural, rechaçar toda e qualquer forma de substancialismo e de causalismo em proveito da noção de arbitrário, como também excluir o sujeito, assim, ?o homem não pode fazer outra coisa senão constatar a sua importância, a sua inanidade em face dos mecanismos que ele vai em ultima instância tornar inteligíveis, mas sobre os quais não tem poder algum?. A generalidade do programa de Lévi-Strauss exprimia-se sobretudo na dupla preocupação de em proveito da natureza simbólica do seu objeto, não se deixar desligar do social, das realidades. Através das modificações de estrutura no nível biológico, buscava-se a emergência da cultura. De um modo geral, o estruturalismo procurava explorar as inter-relações (as "estruturas") através das quais o significado é produzido dentro de uma cultura. Logo, é a partir da negação da historicidade, da busca das origens, que o paradigma estruturalista viria a se desenvolver.
5.
Por que e como o estruturalismo desmoronou do seu pedestal de respeitabilidade e vem sendo substituído por teorias chamadas pós- modernas?R.: O estruturalismo tem sido substituído por abordagens como o pós-estruturalismo e desconstrutivismo, sobretudo porque tem sido freqüentemente criticado por ser não-histórico e por favorecer forças estruturais determinísticas em detrimento à habilidade de pessoas individuais de atuar. O Período de turbulência se encontra entre os anos 60 e 70 e a partir do final do século, o estruturalismo já era visto historicamente como uma importante escola de pensamento, mas eram os movimentos que ele gerou, e não o próprio estruturalismo, que detinham a atenção. Assim, o pós-estruturalismo instaura uma teoria da desconstrução na análise literária, liberando o texto para uma pluralidade de sentidos. A realidade era então considerada como uma construção social e subjetiva. A abordagem é mais aberta no que diz respeito à diversidade de métodos. Em contraste com o estruturalismo, que afirma a independência e superioridade do significante em relação ao significado, os pós-estruturalistas vêem o significante e o significado como inseparáveis. Na antropologia, a corrente pós-estruturalista abandona o próprio conceito de estrutura, por se parecer com uma espécie de "teologia" das sociedades: uma instância imaterial e superior que determina os destinos humanos. Também era criticada a propensão do estruturalismo para as generalizações, em detrimento do conhecimento das especificidades. O estruturalismo passou do campo do pensamento "domesticado" e científico direto para o seu oposto porque, como explicou o autor em sua obra de 1962, ?as artes formam na civilização ocidental uma espécie de reserva ecológica do pensamento selvagem?. Assim, o século XX foi apontado como o século das rupturas, que introduziu um pessimismo profundo em relação à história e o estruturalismo era apontado pelos pós-modernos não como um método novo, mas como a consciência desperta e inquieta do saber moderno. ?O estruturalismo viu-se na situação de responder a uma demanda social de uma determinada conjetura histórica em que o deslocamento do olhar para a figura do selvagem já não significava a resposta a uma necessidade do exotismo, mas a busca desesperada da verdade do homem num universo onde o futuro se encontrava excluído?.
loading...
-
A Morte De Claude Lévi-strauss é Lembrada Por Muitos: Ondina Fachel Leal
Mais um antropólogo fala da vida e obra de Claude Lévi-Strauss. Desta vez é a professora de antropologia da UFRGS, Ondina Leal, num resumo sucinto de algumas de suas principais obras: parentesco, mitos e totemismo. ______________________________________...
-
Homenagem A Claude Lévi-strauss -- 2
Dando continuidade às homenagens a Lévi-Strauss, eis as respostas e considerações de Felipe Montalvão sobre O Pensamento Selvagem e Totemismo. Vale a pena ler seu texto. _________________________________ Felipe Walviesse Moura Montalvão Universidade...
-
Homenagem A Claude Lévi-strauss -- 1
Claude Lévi-Strauss, o grande antropólogo francês, criador da escola Antropologia Estrutural, está fazendo 100 anos dia 28 de novembro. Em sua homenagem dei um curso de Antropologia na Universidade Federal Fluminense sobre sua obra. Lemos diversos...
-
O Pensamento Selvagem - Lévi-strauss
"Como nas linguagens profissionais, a proliferação conceitual corresponde a uma atenção mais firme em relação às propriedades do real, a um interesse mais disperto para as distinções que aí possam ser introduzidas. Essa ânsia de conhecimento...
-
Morre Aos 100 Anos O Antropólogo Lévi-strauss
Do UOL Notícias* Em São Paulo O etnólogo e antropólogo estruturalista Claude Lévi-Strauss morreu na noite de sábado para domingo (1º) aos 100 anos, de acordo com um porta-voz da Escola de Estudos Avançados em Ciências Sociais de Paris,...
Antropologia